Angústia é doença e tem cura
Chego pela manhã ao complexo do Hospital das Clínicas, em São Paulo, e me dirijo ao primeiro andar do prédio do Instituto de Psiquiatria, onde sou recebida pelo chefe do departamento, o psiquiatra Valentim Gentil. Nosso objetivo é definido: caracterizar, com elementos concretos, o conceito de angústia. A missão é árdua. " Diferentemente do medo ou da ansiedade, que são experimentados pela maioria das pessoas, a angústia acomete menos de 50% da população. E nunca tive essa experiência, o que dificulta a tarefa de descrevê-la com precisão " , confessa. " Em geral, meus pacientes relatam uma agonia mental sem gatilho aparente, atrelada a um sufoco semelhante ao da asma, e uma dor ou compressão no peito " , descreve.
Chego pela manhã ao complexo do Hospital das Clínicas, em São Paulo, e me dirijo ao primeiro andar do prédio do Instituto de Psiquiatria, onde sou recebida pelo chefe do departamento, o psiquiatra Valentim Gentil. Nosso objetivo é definido: caracterizar, com elementos concretos, o conceito de angústia. A missão é árdua. " Diferentemente do medo ou da ansiedade, que são experimentados pela maioria das pessoas, a angústia acomete menos de 50% da população. E nunca tive essa experiência, o que dificulta a tarefa de descrevê-la com precisão " , confessa. " Em geral, meus pacientes relatam uma agonia mental sem gatilho aparente, atrelada a um sufoco semelhante ao da asma, e uma dor ou compressão no peito " , descreve.
Incentivar o diagnóstico e um tratamento personalizado é a proposta de Gentil, que assina o artigo intitulado Why Anguish? — em português, Por que angústia? —, que acaba de ser divulgado na publicação científica inglesa Journal of Psychopharmacology. Isso porque, nas discussões entre especialistas do mundo todo, o sentido dessa emoção se esvaziou ao longo do tempo. E frequentemente ela é confundida com o distúrbio de ansiedade ou de pânico (veja os complementos desta matéria).
" Mas são comportamentos mentais diferentes, com padrões de ativação cerebral distintos " , defende Gentil. " A ansiedade é uma apreensão exagerada em relação ao futuro, enquanto a angústia é um sofrimento relacionado ao presente. "
Munida dos esclarecimentos sobre as manifestações físicas do sintoma, sigo ao consultório da psicanalista paulistana Maria de Lourdes Félix, que auxilia Gentil nas pesquisas sobre a face psicológica da angústia. " Meus pacientes costumam levar as mãos ao peito e reportar um sentimento de vazio. Sentem conflitos diante das inúmeras possibilidades de escolhas no dia a dia e questionam o sentido de sua existência " , conta. " Em casos extremos, essas pessoas são dominadas pela introversão. Elas perdem a capacidade de análise, de lidar com o cotidiano, de interagir socialmente. Ficam paralisadas. "
À luz do filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard (1813-1855), a psicóloga Marília Dantas, da Universidade Estácio de Sá, em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, traduz o mal-estar: " O ser humano sente desamparo, incerteza, falta de controle diante da liberdade de decidir. Optar por um caminho significa correr riscos, abrir mão das alternativas. Isso é angustiante " .
Reconhecer um quadro de angústia é uma função que cabe a especialistas. Mas os angustiados de plantão podem contribuir, fornecendo detalhes de como se sentem. É o que constatei nas conversas durante os trajetos de consultório em consultório. A pergunta que fiz a motoristas, recepcionistas, colegas e pedestres com quem cruzei no caminho era sempre a mesma: o que é angústia para você? As respostas variaram. " É pensar como seria minha vida se eu tivesse estudado psicologia. " Ou " É um beco sem saída dentro do peito " . Ou ainda " É uma incerteza sobre as consequências das decisões que tomei " .
Infelizmente, a maioria dos angustiados só procura ajuda especializada quando a sensação ruim beira o insuportável. " Eles chegam ao pronto-socorro com dor e opressão no tórax, peso e desconforto no peito " , confirma o cardiologista César Jardim, supervisor do pronto-socorro do Hospital do Coração, em São Paulo. Os sintomas se assemelham aos de problemas cardiológicos, como infarto. " Mas os problemas cardiovasculares só se confirmam em 30% dos casos " , estima. Ele conta que, depois de realizar exames e apontar que o sujeito está em condições perfeitas de saúde, os pacientes confessam que vêm se sentindo nervosos e... angustiados.
Quando é assim, excluída a presença de doenças físicas, o passo seguinte deveria ser a visita a um psiquiatra. " Há hipóteses de que a angústia seja desencadeada por uma maior ativação de uma região chamada ínsula, no córtex cerebral, relacionada à percepção de funções viscerais, como as do coração, do diafragma e dos pulmões " , explica Valentim Gentil. " Por isso, acreditamos que suas vítimas possam responder bem a calmantes chamados benzodiazepínicos, a alguns antipsicóticos e a uma classe de antidepressivos conhecida como tricíclicos " , continua. " A imipramina é um dos principais medicamentos desse grupo e se mostra eficaz, apesar de promover eventuais efeitos colaterais, como tonturas e alterações cardíacas " , completa seu colega Jair Mari, da Universidade Federal de São Paulo. Essa droga modula neurotransmissores como a noradrenalina, substâncias que agem no cérebro e controlam as emoções.
O ideal é complementar esse tratamento com o de um psicólogo ou psicanalista. " Trabalhamos o desenvolvimento emocional, fazendo com que o paciente reflita e traduza seus pensamentos, criando condições para contornar sentimentos que julga insuportáveis " , explica Maria de Lourdes. A angústia é, portanto, um problema de saúde e necessita de acompanhamento. Se ela anda sufocando-o, chega de sofrer em silêncio: busque auxílio e afrouxe, de vez, esse nó dentro do peito.
Por Adriana Toledo, Revista Abril
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